Crônicas

E agora, Drummond?


Procura-se por José. Onde estás?
Sei que José se foi. Partiu pra Minas Gerais num trem para uma “Cidadezinha Qualquer”. Durante a viagem cantou os amores dos pomares, das palavras espalhadas em milhares bibliotecas, em formas de prosa, versos e poemas. José não tinha nome mesmo. Zombava da morte. Mas, um dia ela o levou sem cansar. Foi uma pena! José faz tanta falta por aqui. Mas, ele quis ir ao encontro do “meio-dia branco azul” perdido entre as montanhas de minério de ferro.
E agora, José? O Poeta desceu na estação tomou seu cavalo preto e saiu a galopar em busca de sua “Infância”. Correu pelos matos sem fim como Robson Crusoé interpretando os temas, as verdades, os passos e os discursos. Ah José! Falando de discursos, não tem mais amores! Quem leu suas teses de vida, do cotidiano, do amor de João pela Teresa, que não teve tanto sucesso por causa da pedra no caminho, tem saudades. Eternas saudades de Teresa. Não sei se ficou santa. Mas no convento pôde rezar mais.  Lili foi sortuda, teve um casamento com tão pouco amor. Casou com o nome de uma nobre família. Afinal, poesia é isso mesmo; nem todos compreendem. 
Sei que estás cansado.!Os galopes foram imensos. Cansou de dançar de “Quadrilha”. Até parece que agora, a dança está entrelaçada com a política. Que pena que não tem mais a valsa vienense. Tudo é comércio. Vendem-se os amores, prometem-se reinos, cantam sem pudores, não escutam os clamores. Ah, Velho poeta! Aqui o povo carece de alma, de beijo e calma. Tudo está agitado, as pessoas também estão cansadas; um cansaço desumano. Parece que “o dia não veio”, o riso também não. E, pior é que a utopia desapareceu. Tudo acabou! Será que vamos mofar?
Pergunto a você, José, como serão os dias vindouros nesta terra, onde faltam gestos para compreender a linguagem dos fracos e dos analfabetos? Os pobres são comparados àqueles que não têm sentimentos. Eles até parecem que não existem. Falta “O sentimento do mundo” para lhes conferir a dignidade, provinda de solidariedade. Estas foram barradas pelas fronteiras das guerras.
Quando falam de ti, José lembro-me das pedras. Elas continuam espalhadas pelos caminhos deste reino. Aqui, ouve-se, diariamente, nos noticiários, que as pedras das drogas tiraram jovens do caminho; elas são as maiores armas. A violência e o tráfico impedem o nosso reino de crescer e muitos estão morrendo, José, com a vida impedida “no meio do caminho”. Famílias inteiras não se esquecem desses acontecimentos, que impedem o destino dos seus filhos.
E agora José, os jovens estão na noite escura. As luzes estão apagadas!
Ao caminhar pelas ruas cantando a “Canção amiga” para que a vida se tornasse tão preciosa como seus poemas, sinto falta do homem “gauche” para preparar outra canção, pois temos que acordar os homens das leis, da cultura e da humanização. José, tenho medo de que as crianças continuem adormecidas, pois tudo gira “no jeito mais natural” e elas não podem perder as belas palavras do poeta.  Às vezes grito com a chave na mão para abrir a porta da vida e da realidade. Precisamos adormecer os homens, pois as pessoas, por aqui, ainda curtem as festas, mas as preferem com as luzes acesas, escancarando tudo, afinal há impunidade. Parece que as coisas ainda vão demorar a acontecer.
Você fez bem em partir para o belo horizonte de Itabira.  Lá reina a boa prosa, o conto e a poesia falam da vida. Que bom que estás lá, pois Minas são muitas. É um país de várias faces.
Mas... E agora José? Você nos deixou no “Poema das sete faces” um homem forte, simples e sério, buscando um mundo vasto, cheio de inocência infantil... Mas, meu Deus, por que nos abandonaste se sabias que eu jamais serei poeta deste mundo caduco? As palavras são apenas rimas, mas não solução para este vasto mundo que não tem mais remédio, porque a noite anoiteceu tudo. Ela dissolve os homens, Carlos.
As crianças! Ah, me esqueci! Muitas não experimentaram o prazer de aproveitar o frescor das sombras de uma mangueira viajando por mares, visitando ilhas... Adormecem nas ruas e pontes, sem medos e horizontes. Sem escola e com fome, fumam e bebem enquanto a noite esfria, pois é claro! Não há paredes. 
José...
Seu nome não é José.
José é um poema.
José é o homem que não tem resposta.
José é o homem que marcha sem direção.
E agora, Drummond?

                                                                                        Crisjoli Fingal 


O papel do pastel


A poluição do meio ambiente é um problema que se agrava cada vez mais nos centros urbanos. O crescimento populacional desenfreado com o processo industrial acelera o aumento de lixo nas vias públicas. Papéis, latas, plásticos, papelão e descartáveis são cada vez notáveis pelas ruas e ainda mais aonde não há cultura de limpeza urbana ou responsabilidade social.

O processo industrial marca a mudança comportamental da civilização com o consumo exacerbado de produtos
 Em meio a tanto consumo, o lixo ganha destaque e com isso é necessário mais gente nas ruas para limpar o lixo humano. Interessante que algumas cidades colocam funcionários públicos nas ruas com vassouras, carrinhos de lixo, pás e que às vezes vão catando papéis de bala, bitucas de cigarros, copos de descartáveis, saquinhos de salgadinhos, tipo isopor, latas de refrigerante e tudo mais que os homens costumam jogar no chão.
Eu fico imaginando o trabalho duro dos varredores de ruas, trabalhando ao sol quente para catar a falta de educação e de responsabilidade ambiental daqueles que destroem a mãe GAIA.
Falta de ética não seria o cômico na Rua Adolfo Olinto, quando eu passava na calçada e a gari comia pasteizinhos de farinha de milho. Achei um absurdo, quando a mesma, após se alimentar, jogou o papel no chão.
Primeiramente, eu assustei quando vi a cena e depois comecei a rir. A gari tinha um latão de lixo à sua frente, pois estava varrendo a rua e segundo, ela estava sujando a rua que ela mesma tem o trabalho de varrer e deixar sempre limpa.
            Depois o cômico virou mais anedota! Comentei com um amigo ao lado que logo disse que ela sujava a rua para ter trabalho para o dia seguinte.
Falta de quê, eu não sei. Mas que foi estranho e divertido, ao mesmo tempo, foi. A gente percebe que educação é um processo de transformação, que gera consciência para depois gerar mudança. O comportamento é sempre necessário para que o globo ganhe mudanças significativas.
Crisjoli Fingal


Meus versos livres


Recentemente conheci uma pedagoga do Estado do Maranhão. Estávamos hospedados no mesmo ambiente em Brasília, após o meu retorno de volta de uma pesquisa literária sobre Cora Coralina. Eu estava retornando da cidade de Goiás e ela, Josidete, Vulgo Jô, Vinha de São Luis, capital maranhense para um curso em Brasília. Falamos de muitos problemas educacionais do século XXI, mas não deixando escapar a importância da literatura para os tempos atuais. Estes encontros, nem sempre perduram. Somos viajantes e no tardio das estradas, encontramos pessoas que cobrem o nosso coração de esperança.
Passados duas semanas, recebo um e-mail de Jô, pois nós tínhamos trocados informações no Mosteiro de São Bento em Brasília. A pedagoga, com sua sensibilidade me saudava com boas vindas a um novo círculo de amizade. Seu e-mail era bonito, com algumas perguntas a respeito das pesquisas Coraliniana. Fiquei muito feliz com o seu e-mail! Em seguida Jô me enviou outro e-mail com o título Dinamarca: Vergonha mundial, com um apelo para assinaturas de protestos contra as matanças de golfinhos. A pedagoga me perguntava de forma chocante: “Como fazer poesia diante de tanta crueldade?” Confesso que não soube responde no momento, apesar de conhecer o e-mail com os relatos fotográficos da insensatez humana. .
Segundo a produção do e-mail é ritual cultural para certificar o processo de maturidade de jovens. A pergunta da pedagoga me a questionar não somente o conceito de maturidade humana, mas, sobretudo o papel da literatura em denunciar poeticamente os malefícios ambientais. Com certeza, não se pode negar o papel da criticidade ao espaço literário, pois a literatura não se deve negar a realidade.
Fiquei por alguns minutos com aquela interrogação. Não fugia de minha mente a vontade de tentar interpretar tal apelo. O mundo envolto a tantos sinais de morte e violência não tem espaço para a poesia ou será que a mesma desmitifica o real, derrubando quaisquer formas de expressar o logos? Coincidentemente, na véspera do ocorrido e-mail, tinha participado de um evento literário que muito me questionou sobre o papel da literatura, onde presenciei a montagem de paradigmas fúteis para representar as letras. Penso que o mundo precisa de escritores que chegam ao coração das pessoas, e para alcançá-lo é preciso ter acesso pelos caminhos singelos da simplicidade. Quanto mais pomposos são os discursos, mas distantes eles ficam da realidade.
E então, me pergunto onde ficam os meus versos livres? Para que escrevê-lo e para quem estou escrevendo? Estas e tantas outras correm pelo mundo do escritor.
Meus versos livres moram no campus da palavra anunciada e denunciada frente ao mundo niilista, ocupado apenas com seus anseios hedonista. Não se pode permitir que o vermelho sanguinário da matança dos inocentes golfinhos, predomina o vermelho da maturidade do amor.
Penso que, talvez o cruel deva merecer minha querida Jô, uma poesia que o torne tão doce como o favo do mel, que as letras quando são “compotadas” com a calda da essência da vida, jamais perderá o seu verdadeiro sabor, que é o de adocicar a razão insossa dos homens ininteligíveis. Sendo assim, continuo a acreditar na força da poesia enquanto prenuncio das verdades eternizadas nos versos livres dos poetas de todos os tempos.  
Crisjoli Fingal

(Crônica publicada In: Veredas Literárias, Assis: Uberlândia, 2011. pp 50-51)



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